quinta-feira, 04 maio 2023 10:15

Lynda Gratton: O maior desafio para a paridade de género é a inércia

Diversidade e paridade são fundamentais para as empresas, defende Lynda Gratton, professora de Práticas de Gestão na London Business School e uma das conferencistas do APED Retail Summit 2023. Aponta a inércia como o maior desafio para a paridade de género, sustentando que muitos são os líderes que estão dispostos a apoiá-la em teoria, mas poucos a põem em prática.

Store | Qual é a principal mensagem que vai abordar na APED Retail Summit?

Tenho quatro mensagens a transmitir. Em primeiro lugar, neste mercado de trabalho difícil para as pessoas de excelência, desenvolver formas criativas de as atrair e reter é crucial. Em segundo lugar, porque as máquinas e a Inteligência Artificial têm e terão um impacto significativo em muitos postos de trabalho, isso coloca uma ênfase tanto na melhoria de competências para que as pessoas possam progredir na sua função, como também na possibilidade de requalificação para um emprego completamente novo. Em terceiro lugar, após o impacto significativo da pandemia, as pessoas procuram mais autonomia no seu trabalho, tanto em termos do local onde trabalham (podem trabalhar em casa?) como do tempo de trabalho (possibilidade de horários mais flexíveis). E, finalmente, as conexões estão a tornar-se cruciais para o trabalho – tanto as conexões entre os pares, à medida que aprendem e se apoiam entre si, como as conexões entre gestores e respetivas equipas.

Em que medida o investimento nas pessoas é um fator competitivo para uma empresa? Como colocar as pessoas no centro do objeto social das empresas?

No centro da competitividade estão as competências e a motivação das pessoas. Sem grandes pessoas, não pode haver uma grande empresa. No entanto, fazer essa ligação é difícil. Em parte, porque, depois do trauma da pandemia, estamos a atravessar tempos difíceis, a lidar com uma guerra na Europa, a enfrentar custos de vida crescentes e a inflação.

Assim, agora é importante, talvez mais do que em qualquer outro momento, fortalecer a ligação entre as pessoas e o objeto social das empresas.

Isso começa com três perguntas: “Qual é a contribuição estratégica única que queremos fazer?”; “O que significa isso para as capacidades exclusivas que queremos desenvolver e apoiar?”; e, finalmente, “Qual é a proposta única que nos ajudará a atrair, reter e desenvolver essas capacidades exclusivas?”.

Qual é o papel da responsabilidade social empresarial na atração e retenção de talentos numa empresa?

As empresas têm potencial para desempenhar um papel socialmente responsável de três formas relacionadas: pela forma como tratam os seus próprios colaboradores e os que se encontram nas suas cadeias de abastecimento; através do seu apoio às comunidades e bairros locais; e através da forma como utilizam as suas capacidades e competências para enfrentar problemas globais significativos, como as alterações climáticas ou a desigualdade social.

Ao longo da última década, o desempenho das empresas nestas áreas tornou-se mais transparente através das vozes dos trabalhadores (por exemplo, na Glass Door), através de empresas sociais que monitorizam e comunicam os objetivos e resultados empresariais, e de acionistas que seguem os objetivos do ESG. Não há dúvida de que, quando as pessoas tomam a decisão de se juntarem a uma empresa, são influenciadas pela transparência destas conclusões. E para alguns potenciais colaboradores, essas questões são centrais para a sua perspetiva sobre o objeto social das empresas.

Qual é o papel da empresa e do líder neste mundo em mudança? As empresas estão a evoluir de forma suficientemente rápida para acompanhar as mudanças?

Há uma década talvez o papel do líder fosse dirigir uma corporação hierárquica de cima para baixo, onde pudesse comandar e controlar através dos níveis de poder. À medida que a tecnologia se uniu aos colaboradores, essas hierarquias de comunicação começaram a dissolver-se. E como os colaboradores queriam mais autonomia e um maior controlo sobre o seu trabalho, isso também mudou o papel dos líderes.

Agora, os grandes líderes estão em contacto com os seus colaboradores, escutam as suas vozes, são empáticos e são grandes modelos.

Algumas empresas estão rapidamente a tentar formar líderes jovens e apoiar o desenvolvimento de líderes mais velhos. Outras ainda estão presas no mundo de há dez anos, pautado pelo poder hierárquico. Com o tempo, têm vindo a descobrir que as suas pessoas mais talentosas estão a ir-se embora e o seu poder está a diminuir.

Quais são os principais pontos fortes da nova geração de líderes?

Os grandes líderes podem ter qualquer idade: é mais uma questão de estilo pessoal do indivíduo, a maneira como pensa sobre liderança e como se envolve e empodera os outros.

Que competências de liderança são imperativas, atualmente?

Os grandes líderes têm tanto uma perspetiva externa quanto interna. No que diz respeito à perspetiva externa, têm uma compreensão do mundo ao seu redor, dos desafios enfrentados e das partes interessadas (por exemplo, governos) que poderiam fazer a diferença para a sua empresa. De uma perspetiva interna, têm autoconhecimento e são capazes de criar empatia com os outros.

A diversidade nas empresas é imperativa? É cada vez mais vista como uma força e não como uma fraqueza?

Quando as empresas têm equipas de liderança homogéneas (por exemplo, pessoas apenas do sexo masculino ou da mesma etnia), sofrem daquilo que se denomina “pensamento de grupo”. Por serem muito semelhantes entre si, acreditam nas mesmas coisas, têm as mesmas redes de contacto, são partes da mesma informação. Isso pode conduzir a tomadas de decisão catastróficas. Quando as equipas são diversificadas, são capazes de ver mais amplamente e são menos propensas a fazer julgamentos errados. É por esse motivo que a diversidade é tão imperativa, sendo uma força e não uma fraqueza.

Como estão as empresas europeias a sair-se, em termos de diversidade e inclusão?

Existe uma grande variedade nas empresas europeias, em termos de diversidade e inclusão. Isso acontece em parte porque os próprios países são diferentes. Por exemplo, no que se refere à paridade de género, a Suécia ou a Dinamarca estão significativamente mais bem classificadas do que a Itália. Há também diferença entre os vários setores de atividade. Por exemplo, o setor dos cuidados de saúde e o setor farmacêutico, em geral, têm uma maior paridade de género do que o setor bancário. Por conseguinte, algumas empresas europeias estão a ter um bom desempenho nesta matéria, outras não.

Em termos de paridade de género, quais são os maiores desafios para as empresas? O que é preciso fazer para ter mais mulheres em posições de liderança?

O maior desafio é a inércia.

Os líderes sabem que a paridade de género é uma coisa boa, muitos estão dispostos a apoiá-la em teoria, mas poucos a põem em prática.

Sabemos, através da investigação sobre o aumento da paridade de género, que há uma grande variedade de ações que têm de ser realizadas. Algumas são óbvias. Por exemplo, garantir que em cada júri de seleção exista igualdade de género e que haja sempre mulheres na lista de pré-seleção. Mas algumas ações são mais amplas, por exemplo, incentivar os homens a tirar licença de paternidade para que a educação dos filhos não seja vista apenas como uma prioridade feminina.

No Reino Unido, uma das medidas que fez a diferença foi a comunicação anual, por parte de cada empresa, da paridade de género em cargos superiores. Esta comunicação anual incentivou aqueles que têm uma paridade de género débil a implementar mais medidas nesta matéria.

Como pensa que será o futuro do trabalho e de que forma as empresas e os indivíduos podem preparar-se?

O modo como trabalhamos tem sido influenciado por três tendências principais: a tecnologia (o impacto da Inteligência Artificial e das máquinas), a demografia (o envelhecimento da população ativa) e as tendências sociais (por exemplo, mais mulheres em cargos superiores).

Em conjunto, estas tendências alteraram a dinâmica do local de trabalho, com ênfase num trabalho mais ágil, numa maior flexibilidade e num maior enfoque na atualização e reciclagem de competências.

A pandemia veio acelerar estas tendências (por exemplo, as tendências digitais), criando ao mesmo tempo oportunidades para as pessoas refletirem mais profundamente sobre o que querem do trabalho. Por exemplo, durante a pandemia, a maioria dos trabalhadores aprendeu a trabalhar de forma mais flexível, e muitos estão agora a adotar essas formas mais flexíveis de trabalhar como a nova norma.

 

Esta entrevista pode ser lida na íntegra na edição de janeiro/março 2023 da Store.

Fonte: Store Magazine

 

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